Procura por planejamento sucessório aumenta durante pandemia, dizem advogados
“Principais objetivos para organizar testamento são evitar brigas na família e manter prosperidade dos negócios”
Escritórios especializados em planejamento sucessório registraram, ao longo da pandemia do coronavírus, um aumento significativo na procura por orientações sobre como organizar testamentos e transmitir o patrimônio para as futuras gerações de acordo com as vontades dos clientes. Os principais objetivos para planejar a sucessão, segundo advogados, é evitar brigas na família e manter a prosperidade dos negócios.
Apesar de a morte ainda ser um tabu e o medo de pensar no assunto fazer com que muitos clientes adiem o planejamento da sucessão, advogados avaliam que a pandemia do coronavírus tem trazido o tema à tona, seja porque conhecidos ou familiares contraíram a Covid-19, seja pelo crescente número de mortos no país. Segundo o consórcio de imprensa formado entre o Estado de S.Paulo, Folha de S.Paulo, G1, O Globo, Extra e UOL, o Brasil tinha 50.737 mortes por coronavírus confirmadas até as 13h desta segunda-feira (22/6).
A advogada Marina de Barros Monteiro, sócia do contencioso cível do Miguel Neto Advogados, relata que antes da pandemia costumava fazer 5 planejamentos sucessórios por mês. A frequência começou a crescer em março e, a partir de abril, chegou a 10 planejamentos mensais.
E a procura não é restrita a pessoas com idade avançada ou do grupo de risco do coronavírus, afirmou a advogada Andréa Caliento, sócia no Lefosse Advogados que atua na área de reorganização patrimonial sucessória. “Muitas pessoas jovens e saudáveis também ficaram preocupadas e decidiram fazer seus testamentos. Em alguns casos, já estávamos conversando com esses clientes e eles decidiram acelerar o processo e assinar seus testamentos”, disse.
Pessoas mais jovens e fora do grupo de risco também planejam sucessão
O advogado Marcelo Paolini, sócio da área de organização patrimonial e sucessões do L. O. Baptista Advogados, relata que geralmente os clientes são muito reticentes e resistentes em fazer o planejamento da sucessão. “Agora com a pandemia as pessoas enxergam o testamento como uma providência importante a ser feita. Não que vá ser usada, mas se acontece uma fatalidade pelo menos a pessoa sabe que a última vontade dela será respeitada”, disse.
De maneira geral, o planejamento sucessório pode ser feito por meio de testamentos, doações em vida e criação de holdings que reúnem o patrimônio para transferência após a morte. Entre os bens a serem transmitidos, há ativos líquidos e financeiros, imóveis e participações societárias.
Conflitos e empresas familiares
Segundo a advogada Marina de Barros Monteiro, sócia do Miguel Neto Advogados, o principal motivo para que clientes busquem organizar a sucessão é reduzir possíveis disputas na família. Outra finalidade relevante, segundo Monteiro, é organizar mecanismos para definir o futuro da administração de empresas familiares a fim de manter a prosperidade dos negócios.
Para se fazer um bom planejamento sucessório é preciso se fixar na história daqueles indivíduos. Às vezes importam muito questões como qual confiança um cônjuge deposita no outro. Às vezes dentro de uma irmandade tem um filho que é mais produtivo e outro que é menos, e os pais dizem: ‘vamos colocar tal tarefa para esse’. É tudo muito subjetivo
No caso de empresas familiares, por exemplo, os donos podem fazer constar no planejamento sucessório atribuições de função ou disposições sobre quem será responsável pela gestão. “A administração é uma função, que visa justamente a preservar ou otimizar o patrimônio de todos. Então se percebo que um dos filhos tem mais tino para negócios, nada impede que seja nomeado administrador. Ou até mesmo que seja nomeada uma pessoa de fora”, afirmou.
Isolamento social: testamento emergencial
Para clientes em isolamento social, o advogado Marcelo Paolini, sócio do L. O. Baptista Advogados, recomenda que as pessoas organizem o patrimônio ao menos provisoriamente por meio de um testamento particular emergencial. A modalidade, prevista no Código Civil, só pode ser feita em circunstâncias extraordinárias justificadas no testamento, hipótese em que se enquadra a pandemia do coronavírus.
De maneira geral, os testamentos particulares podem ser feitos de próprio punho e, para serem válidos, precisam ser assinados por três testemunhas. Na data da morte, pelo menos uma das testemunhas deve estar viva para atestar que o documento é válido e corresponde à vontade do falecido.
Testamento particular emergencial não precisa de testemunhas
“A grande vantagem do testamento particular emergencial é que ele não precisa de testemunhas. Torna-se uma alternativa interessante”, afirmou. Se o testador falecer, o documento é levado ao juiz para validação.
“A doutrina entende que a pandemia é justificativa mais do que razoável para elaboração do testamento particular emergencial, porque nesse momento todos estão evitando contato com quaisquer outras pessoas”, disse.
Doações em vida para reduzir tributação
Para mitigar os efeitos da pandemia do coronavírus, tramita na Assembleia Legislativa de São Paulo um projeto de lei que aumenta de 4% para 8% a alíquota do Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITCMD). O PL 250/2020 também aumentaria a carga tributária ao mudar a base de cálculo, afirmam advogados.
Se o projeto de lei for aprovado em 2020, o novo cálculo do ITCMD entra em vigor em 2021. A fim de aproveitar a alíquota atual e mais benéfica ao contribuinte, a advogada Andréa Caliento, sócia no Lefosse Advogados, recomenda que os clientes organizem doações em vida ainda esse ano. “Não há como reduzir a tributação apenas pela elaboração de testamento porque a legislação aplicável é aquela no momento do falecimento”, disse.
Nesse sentido, o advogado Marcelo Paolini, sócio do L. O. Baptista Advogados, afirmou que as doações em vida são uma ferramenta eficiente do ponto de vista fiscal.
“O PL está redigido de forma coerente com outros estados que já elevaram o imposto, vemos como bastante possível a aprovação do projeto. Isso é um incentivo para as pessoas ficarem atentas para ver se é o caso de fazer doação em vida e aproveitar a legislação atual”, afirmou. Outros estados como Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul e Distrito Federal também aumentaram as alíquotas do ITCMD nos últimos anos, mesmo antes da pandemia da Covid-19.
Fonte: https://www.jota.info/justica/planejamento-sucessorio-pandemia-256053-22062020