A reforma da Lei de Falências

A reforma da Lei de Falências

O projeto substituto torna o sistema brasileiro mais moderno e adequado às necessidades do mercado

O Brasil está finalmente perto de aprovar a primeira grande reforma da Lei nº 11.101 (Falências e Recuperação de Empresas), de 2005, que há muito vem sendo discutida por estudiosos e profissionais da área. A discussão teórica dessa reforma de grande relevância para as empresas brasileiras teve início em 2016, quando o governo brasileiro decidiu tomar algumas medidas para aumentar a eficiência dos processos de insolvência e transformar o Brasil num destino mais seguro para investidores estrangeiros, sendo este um dos principais caminhos para superar a crise econômica.

Nesse sentido, o então Ministério da Fazenda criou uma comissão para estudar e redigir um projeto de lei para reformar a Lei nº 11.101/05 (Portaria nº 467, de 16 de dezembro de 2016). Como resultado dos esforços da mencionada comissão, foi apresentada no final de 2017 uma minuta de projeto abrangente e complexa.

O projeto substituto torna o sistema brasileiro mais moderno e adequado às necessidades do mercado

Durante o período em que permaneceu na Casa Civil do governo Temer, as autoridades fiscais fizeram muitas alterações no anteprojeto original, transformando-o num projeto exageradamente favorável ao Fisco, se distanciando dos principais objetivos de uma necessária reforma do sistema de insolvência. Devido às alterações, o projeto perdeu o apoio de muitos setores, incluindo dos membros da própria comissão.

Mesmo assim, apesar das inúmeras críticas, o Ministério da Fazenda enviou o projeto de lei ao Congresso em 2018 (PL nº 10.220, de 2018). Devido à falta de apoio e à forte resistência de importantes setores da economia, a Câmara dos Deputados não avançou com a discussão e aprovação do projeto.

Este ano, sob o novo governo, destacando a atuação do ministro Paulo Guedes, o tema entrou novamente na pauta da agenda econômica do país, ou seja, a organização da economia brasileira e o desenvolvimento de um sistema mais eficiente de reorganização das empresas foram consideradas essenciais para superação da crise econômica.

Dessa forma, em maio deste ano, o Ministério da Economia criou uma nova comissão para trabalhar na formulação de um projeto de lei (projeto substitutivo), a partir de duas premissas fundamentais: ampla discussão com os diversos setores afetados pela crise das empresas e a busca por um consenso sobre os principais pontos a serem reformados.

O deputado federal Hugo Leal (PSD-RJ), designado pelo presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), assumiu a liderança do projeto na Comissão e na Câmara dos Deputados.

De acordo com o projeto substitutivo, é possível destacar dez principais pontos. O primeiro é o reequilíbrio do poder dos credores, com destaque para a possibilidade de apresentação de plano de recuperação judicial pelos credores e vedação a distribuição de lucros ou dividendos pelos sócios da devedora. A maior segurança jurídica também é uma preocupação do projeto, ao definir de forma precisa o voto abusivo. Persegue-se, ainda, a redução do problema da sucessão nas unidades produtivas independentes e na alienação de bens.

O Fisco ganhou tratamento adequado à sua importância, mas compatível com a necessidade de preservação da atividade empresarial. Nesse sentido, há previsão de sua participação no processo recuperacional, com destaque para a criação de solução para a tributação do hair-cut (RJ) e do ganho de capital na alienação de bens (falência), a transação fiscal e novo parcelamento do crédito fiscal, além da maior participação do Fisco também na falência.

O projeto substitutivo também busca conferir maior modernização, desburocratização e celeridade aos processos de insolvência, com destaque para a revisão dos prazos processuais e criação de sistema eletrônico para deliberações dos credores, deliberações por adesão, intimação eletrônica, leilão eletrônico, compartilhamento de custos, fim do preço vil nas alienações judiciais e restrições à impugnações.

Há significativa facilitação do encerramento da recuperação judicial e da falência. Há também a intenção de melhorar a eficiência da liquidação de ativos na falência, com redução do prazo para o recomeço empresarial do falido (fresh-start). Ponto igualmente importante, relacionado à injeção de dinheiro novo nas recuperações judiciais, é a criação de superprioridade para os créditos concedidos na modalidade de financiamento do tipo DIP Finance.

Há expressa previsão e regulação da prática jurisprudencial da perícia prévia, uma vez que se trata de boa prática reconhecida pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Há ainda regulamentação expressa da recuperação judicial de grupos econômicos e da ocorrência da consolidação substancial. Por fim, o projeto substitutivo traz uma completa regulação para insolvências transnacionais, com adoção do padrão utilizado pela Lei Modelo da Uncitral.

O projeto substituto, que já foi entregue oficialmente à reunião de líderes na Câmara dos Deputados no dia 17 de setembro, tem como grande mérito a reforma de aspectos pontuais que tornam o sistema brasileiro de insolvência mais moderno e adequado às necessidades do mercado. No mais, restam preservados os institutos já sedimentados na jurisprudência dos tribunais, em respeito à segurança jurídica.

Construído a partir de discussões amplas e profundas com diversos setores do mercado e da academia, o projeto substitutivo pode ser considerado como um texto de consenso. Nesse sentido, espera-se que a proposta tramite regularmente no Congresso, atingindo sua aprovação em curto espaço de tempo. Definitivamente, será uma vitória para todos os brasileiros.

Fonte: https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2019/10/14/a-reforma-da-lei-de-falencias.ghtml

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